Amar e ser amada
Dentre todas as coisas que escolhi ensinar à minha filha Ana Beatriz nesta deliciosa caminhada que temos feito juntas, a que está no topo da lista e me move como mãe é que aprenda a "amar e ser amada". Parece simples? Não é. Nós, mulheres, somos desde sempre doutrinadas a dar. Quero que ela aprenda a relevância do receber. E o quanto essa aprendizagem influenciará em suas escolhas ao longo da vida.
Fêmeas, carregamos séculos de discursos de como nascemos para cuidar, zelar, curar, consolar, alimentar, acalentar e tantos outros verbos de entrega e doação que, por ser a lista infindável e definitiva, jamais a questionamos. Nosso talento é esse, disseram-nos, amar incondicionalmente. E como somos boas nisso! Aprendemos e aperfeiçoamos a arte de viver para os outros. De dar sem pedir nada em troca. Esta seria a essência feminina. E, em grande parte, é.
Porém, há um outro lado. Um vasto campo de aprendizado para trazer à tona e passar para as nossas filhas para que elas repassem às delas e reescrevam nossa história. É preciso exercitar, desde cedo, o amor por si, venha ele de dentro ou de fora. É preciso permitir-se. O "eu mereço", "eu posso", "eu gosto" e, principalmente, o "eu me amo" e "eu sou amada". Então todas as demais tarefas e desafios da vida tornam-se motivos e fontes de felicidade.
Para quem sabe amar e ser amado, estudar nada mais é do que uma troca de prazeres, dar o melhor de si e receber conhecimento. Exercitar-se é esforço por superação. Mudar de cidade? Receber o novo de braços abertos e mandar cartas carinhosas para o passado. Cria-se uma cumplicidade gostosa entre o que vai e o que vem, entre as perdas e os ganhos. Assume-se uma responsabilidade sobre causas e consequências. Define-se os contornos do "eu" e do "outro".
Não importa se minha pequena quiser ser bailarina, contadora de história, engenheira ou astróloga, vai se dedicar a algo que lhe dê um retorno, que a satisfaça. Da mesma forma, vai buscar um parceiro que lhe respeite, admire, incentive e a faça crescer. Que a ame. Que desperte o melhor que ela pode ser, pois só quem se sabe amada sabe amar-se e às várias versões de si mesma.
Ana Bia tem 7 anos e é uma criança feliz e faceira. Nasceu no Rio de Janeiro, onde hoje mora seu pai (somos separados), com 2 anos partiu comigo para Porto Alegre, aos 4 voltamos para o Rio e em 2012 aterrissamos em São Paulo. Em vez de sofrer com as mudanças, ela coleciona casas e parentes, acha incrível termos tantos lugares para chamar de "nossos".
Ao desembarcarmos em Sampa, mala e cuia, a "periquita", como a chamo, me sai com essa: "Mãe, posso escolher a próxima cidade em que vamos morar?". Eu, pega de surpresa, respondi que sim, claro, “quer voltar para o sul, Bia?”, achei que já estivesse com saudade. "Não, mamãe, quero morar em Paris!!!".
Sorri. E sigo assim, lado a lado com essa menina querida, amando e sendo amada, tentando aprender o que pretendo ensinar. E, a partir de agora, compartilhando aqui nossas peripécias com vocês.
*Por Ana Kessler. Texto publicado originalmente no blog De Mãe Pra Mãe, projeto Unilever/MSN (2012). Ao longo de dois anos, as jornalistas Ana Kessler, Adriana Teixeira e Mariana Della Barba escreveram semanalmente sobre maternidade real, sem filtros e com muito amor.
Comments